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Alterações climáticas



Há muitas pessoas confusas sobre o que se passa com o clima, pois assistem aos apelos da Organização das Nações Unidas para uma redução urgente da emissão de gases com efeito de estufa (GEE), enquanto, ao mesmo tempo, os dirigentes de alguns países negam as alterações climáticas e os EUA se retiram do Acordo de Paris. Não me vou debruçar sobre os termos impróprios que alguns dirigentes (felizmente, raros) aplicam quando se referem às alterações climáticas, nem ao tom jocoso com que por vezes aludem a este assunto, parecendo que não é um problema suficientemente grave para ser levado a sério. Mas, afinal, o que é que significa “negar as alterações climáticas”? Significa que não estão a acontecer? A recente evolução da temperatura ambiente e o degelo dos glaciares parecem ser uma prova irrefutável de que o aquecimento global é uma realidade. 

O Quinto Relatório do Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (IPCC), publicado em novembro de 2014, afirma, com baixo grau de incerteza, que o ser humano é responsável pelo aquecimento global em curso e alerta para a necessidade urgente de se controlar este processo. Segundo este relatório, é provável que o aumento da temperatura média global à superfície da Terra ultrapasse, até ao final do século (2081-2100), 1,5 °C relativamente à temperatura registada no período pré-industrial. Existe mesmo o risco de se exceder a fasquia de 2 °C, valor a partir do qual se convencionou haver consequências perigosas para os sistemas naturais e para a humanidade. Um relatório mais recente do IPCC, publicado em 2018[1], antecipa um provável aquecimento de 1,5 °C já para 2030-2052.

A hipótese de que o recente aquecimento global resulta principalmente da atividade humana é apoiada pela grande maioria dos cientistas que publicam trabalhos nesta área, bem como pelas academias nacionais de ciência de muitas dezenas de países[2],[3].

Neste momento, a questão crucial é saber o que devem fazer os decisores políticos (governantes). A resposta é óbvia: reduzir urgentemente as emissões de GEE. Esta medida justifica-se por haver um consenso científico muito alargado de que esta é a principal causa do aquecimento global e porque, com o passar do tempo, a situação se pode tornar irreversível. Os governantes que alegam a falta de certeza científica absoluta como razão (ou pretexto) para o adiamento de medidas, devem ser recordados do princípio da precaução (ou, dado o baixo grau de incerteza, o princípio da prevenção) - conceitos relevantes no âmbito do Direito Ambiental. Segundo o princípio da precaução, consagrado na Declaração do Rio/92, para que o ambiente seja protegido, devem ser aplicadas medidas preventivas pelos estados; onde existam ameaças de danos sérios ou irreversíveis, não pode ser utilizada a falta de certeza científica total como razão para o adiamento de medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.

Devemos lembrar-nos de que se prevê um aumento da população humana nas próximas décadas, passando de 7,7 mil milhões em 2019 para 9,7 mil milhões em 2050, o que faz aumentar a pressão sobre o sistema climático. De acordo com as projeções do IPCC, se nada se fizer, as emissões de GEE continuarão a subir e as alterações climáticas aumentarão de magnitude. As consequências podem ser dramáticas e envolvem o degelo acelerado de glaciares e calotas polares, uma acentuada subida do nível do mar, a alteração do regime de precipitação, o aumento da frequência de eventos meteorológicos extremos, uma perda drástica de biodiversidade, uma modificação generalizada da estrutura e do funcionamento dos ecossistemas, etc. As alterações climáticas não são o único problema. Por exemplo, estima-se que a absorção de dióxido de carbono pelos oceanos tenha provocado uma diminuição do pH da água (fenómeno comummente designado por "acidificação dos oceanos”) desde o início do período industrial, e esta situação tenderá a agravar-se. Isto é problemático para organismos marinhos que segregam estruturas de carbonato de cálcio (ex.: corais, moluscos, etc.), podendo alterar habitats e cadeias tróficas, e afetar drasticamente os ecossistemas marinhos.

Todas as alterações acima referidas podem ter um impacte dramático na humanidade devido à inundação de zonas costeiras, à perda de recursos naturais (ex.: falta de água doce associada aos glaciares, carência alimentar, etc.) e ao colapso de serviços ecossistémicos que são essenciais para a sua sobrevivência. As próximas gerações poderão vivenciar situações de grande instabilidade, e isso pode levar a uma escalada de conflitos armados, o que na era nuclear se torna particularmente perigoso. Um potencial risco desta magnitude não pode ser tratado levianamente.

Por tudo o que foi dito, ficamos perplexos por assistir à atitude de alguns dirigentes políticos que parecem mostrar uma total insensibilidade em relação a este problema e um desprezo completo por todos os consistentes sinais de aviso de um perigo iminente. Trata-se, indiscutivelmente, de uma visão irresponsável, egoísta e egocêntrica. É irresponsável porque ignora os princípios da precaução e da prevenção.  É egoísta porque oferece riqueza à geração atual (leia-se, eleitores), hipotecando o património das gerações futuras. É egocêntrica porque coloca o ser humano acima das outras formas de vida, negligenciando-as, ou porque coloca os interesses económicos de um país à frente do interesse comum de todas as nações. Neste contexto, é altura de a civilização dar mais um passo em frente no caminho da globalização, do desenvolvimento sustentável e da justiça entre os povos: a violação do princípio da precaução deve ser julgada nas instâncias próprias, no tribunal do mundo.


[1] https://report.ipcc.ch/sr15/pdf/sr15_spm_final.pdf
[2] John Cook et al., 2013, Environ. Res. Lett. 8 024024
[3] John Cook et al., 2016, Environ. Res. Lett. 11 048002


Carlos Miguez
Professor do Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro

 
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